quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Arte

quando 'm versos abissais
meu todo explode - só
o nada avante sinto

ó Melancolia
faz da arte em mim
Teu labirinto

Instante

e silente vago
amarga mente
a minha idéia?
sensações...

Solidão

tudo é nada
passa
eu em tudo

Reflexão

meu olhar sobre o rio
será só
meu olhar sobre o rio

Corpos

ante
entre
sobre

e assim se
gasta a
noite

Bagdá

esta noite
pano negro
sem pires

lírios bolorentos
num convulso amarelo
parem moscas

sobre Bagdá avoam acauãs serenas

temos olhos surdos

mas
(segredo!)
nosso verso pode ser vômito negro.

Agnus' Dead

ai de vós, ó Forjados no Lodo!
do pó sorveis asilo e sustento,
as fibras partindo em labuta inclemente.
só aos vermes servis... de adubo!

curtidas entranhas que cáusticos ventos
descarnam num soar sem fundo,
as almas a assar sob o arfar do Engodo,
à Desgraça avançais... molemente.

fragmentos aspersos dum intermitente
sutil pulsar, ai! a entoar catacreses,
Sestros, arrastai-vos ao Poente!

nas negras torres do sangue, inertes,
sentis galopar Morbidez - triunfante...
os anjos balbuciam: agnus' dead.

Dor

ao chão do asilo
mães n'alzheimer
depõem rosas necrosadas

são meus males
aos pés
como olhos por sobre

(o punhal
meu consorte
este mar que evanesce)

Amantes

suave... a noite.
açoite = espera.
quimera: velas.
veleja, ó nave!

ponteiro - parado.
o bonde - parado.
a vida - parada.
coração? revolto

Cireneu

Quem recolha as crostas dos anos sidos
quando uma alta e breve mão comprime
mi'a carranca vítrea, não tenho. Amigos?
Não há quem me venha adivinhar os crimes

almejados dentre a leva humana quando
à putrefacta chama vem arder-me o eterno.
Quem, como eu, se entregue entre coxas n'antros
de moçoilas vãs, por amor sincero,

através da bruma, quando a noite cessa
em xilocaína ou vias de unha às costas...
Quero! Clamo! Espero um cireneu: espessa
fíbula que sustenha a Alma decomposta!

Simonistas

’screvo do extremo centro
do círculo de Pascal,
sob o suor do Irascível,
à soleira do abismo...

a ver passarem uns sestros
por onde passaram olimpos.
uma seminal romaria
de simonistas bufantes!

“evoé Absinto”, suspiro
da várzea a que me achego.
ai Noite (aia de meus ais)...
mil insepultos em acervo!

Delírio

’nlaçam-se ’m rinha
na torre mais alta
o Verso e o Avesso.

mormaço sob a pele.
Eros ou Káli?
Sendero ou cigarro?

degustam mo sangue
e à mesa se põem
cabisbaixos?

so latim... sa lástima...
’sfregam ma vista
no despenco!

solitude ’scuma
Galera
’delantes várzeas

vem dar-me a mão
Sereno
depõe-me ao leito.

Bucólico

sob o arvoredo – réstias de outono –
imerso em cancros – farpas de vida.
viesse um filho fender-me o sono,
a mão pendia... mas comovida.

risca-me a sede um tísico frasco.
os cachos... aos dedos das senhoras.
instantes cedo ao luís que masco.
kadish freme, o peito, às horas.

após: lis... varais de acordes...
espaços pra repor a grassa rima...
ao nada as vestes! para os fiordes!
crepusculares vêm, pesar-me em cima.

preocupar-me devo? sei ser de todos
(de reto mesmo só o tombar das toras).
mas pode a sanha de um visigodo
monções cravar ao s’ ir das moras?

Desencanto

derradeiras mágoas
de den’ do ubíquo Seio
espargem-se – conselho
a refratar-me o cenho

sobre a face das águas
se estende em devaneio
EU – a chorar – espelho
de faces que já não tenho

Bandeira

deve o poeta
às mesuras
lamber verrugas
dum bento anel?

melhor seria
sorver cicuta
ambrosia
ao crânio augusto dos anjos!

que tal
dos trapos remelentos
dos fedelhos
cerzir
as listras e cesuras
de uma bandeira?

irmãos de espanto,
ao Muro aferrem
um beijo cáustico!

pra vos torpor,
quantos ares nauseabundos
de pardonnez-moi
será preciso arar?

Militância

de sua cripta acidental, o Sonho,
sob o Letes, límpido adeja.
os insones vagantes dão-lhe,
em taberna sem-par, de beber.

levanta densa das masmorras, Névoa,
e às praças vem, em espásmica sanha,
pra ávidos faunos que, em sedenta leva, a
tanques sebentos, vaudevilles vão.

Juventude de alma delgada,
que nos muros d’ Outrora deitou
mil vendetas em viscerais loas,

queda à lombra do pós-coito...
a esfriar o suor (e o silêncio)?
às Ruas já! à Luta já! ao Gozo!

Vocação

disforme massa ígnea
contida em cela de ar
entre ocasos a Insígnia
me põe zigoto a alar

um suspirar me leveda
viceja à aragem cíclica
musas ditai novo Veda
sangra de mim ó encíclica

torcei-me as fibras cardíacas
ai podres portões da Galícia
sedimentai elegíacas

silente a ressaca releva
farto nanquim sobre a liça
a marulhar vem a leva

Garota

estranha beleza a tua...
camelô do Oriente em Veneza,
que ao suor de esquinas virgens
falseia odes nascentes.

estranha beleza a tua...
traço que se impõe à borra.
primavera vulgar de minha voz,
suspensa a abstratos lírios.

melancolia apátrida...
esta tua beleza estreita,
de enleio à janela – morta.

halali de imundo infante.
um aro de amor-perfeito
sobre um semblante de mãe.

Jerusalém

meus gemidos têm clamor de Ti, cidade
de sigilos, lanças, moedas, preces...
do Menorá, que hoste alguma arrefece...
da Presença, perdida no caos das vontades...

das calçadas que untaram as sacras 'percatas
dos que por Ti sobre Ti ante a turba voraz
ousaram dar mais substância à paz,
ó Jerusalém para além da Vulgata!

ó rubi entre cacos, Tua glória esvai
quando os filhos d'Abr'ão se dão (felizes!)
às pedras, aos tiros, cidade, aos mísseis
- blasfêmias riscadas nos céus de Adonai!

Vaticano

à lombra do Signo a barlavento
eis que me ponho a suar o adiddas
pra mirar o Bom Círio – neo rebento
atracado a mil almas curtidas.

terei cá entre as moscas uma guarida?
na carniça que alveja o olhar Bento,
elas cravam - harpias enegridas -
garras às hostes vis - nos sacramentos!

se cerzir circunlóquios é o intento
dos que tocam o oculto, à filia
dos que dobram a cerviz, eu só lamento
querubins macularem a Homilia.

consummatus: havemos papa.
veste a bata já – olha o Rapa!

Suzy

os sonhos de Promethea
são potes cheios de areia
mas que reabrem passagens.

são grãos que portam jazidos
lembrando éons perdidos
n' inconsistentes miragens.

mil devaneios reacendem
de Baco Seu sol cadente...
e o sonho Mistério faz-se!

ai... Suzy sonha com tudo
e às vezes dorme, contudo,
impune - tal se não sonhasse.

Regina

singraste aformes multidões sem face firme,
o norte a errar - em dor - feito uma estrela tonta
que aponta o não-virá nas horas mais desertas.

de imaginária foz vieste, eu sei, mas - vê - és mar!
um dia eu fui para o que eras e houve encaixe!

me dá de caiar teus soluços, preta.
roçar teus olhos quietos com sorrisos.
despentear tua rouca voz na madrugada.

sigamos vida adentro por todo o resto de nós.

Ele

Com pés de círio
E um bafejar de abadia eunuca,
O Pai me pesa
– alfarrábios não lidos.

Crava-me fugas no dorso...
E clamo por marinheiros
Das grades do situado,
No indefinível absorto.

Ainda tanto a soar
Sob a mordaça sutil
De quem me adensa e me castra!

Não-quisto, sim, mas viceja
A salvo das reticências,
Onde minha Mãe já não afaga!

Manhã

café mormaço chinelo
os pensamentos de pé
a língua dormente espasma

aconchegante Marlboro
a remembrança vagueia
sob este incenso de acaso

toalhas... 2
cerzidas
à identidade da corda.

Identidade

sou eu
que escrevo
o que escrevo?

e quem sou
eu
de escrever
feito fosse?

sou eu
que escrevo
o que escrevo?

e quem sou
eu
de escrever?

sou eu
que escrevo
o que escrevo?

e quem sou?

Noturno

Não vem beijar-me a Brisa
à noite em que me encerro
esparso – em relva lisa
ou ferros de caderno.

Não vem tocar-me o Verso
à noite em que me ocaso
eirado – para o inverno
ou soneto devasso.

Não vem sentir-me a Selva
à noite em que me espasmo
exausto – à densa leva
ou seco pleonasmo.

Só a tua mão em minha face,
Nara, eu sinto! A esfarelar-se.

Queda

Caí de tua fenda vaginal,
nobre Sarjeta! Altercação viril
que teu rasgo andaluz abriu.
Eis-me mística escória, afinal!

Marcaram-me a nádega em meta
de eu ser arara ou viúva ou rotor!
Rum: Mochila: O estâmago em dor...
Adieu, fraque fu: Oi, vendeta!